Aplicações da Supercondutividade - O skate voador da Lexus

domingo, 9 de agosto de 2015

Estaneno: A um passo da supercondutividade a temperatura ambiente




Redação do Site Inovação Tecnológica -  06/08/2015

O estaneno é um isolante topológico, um tipo de material no qual os elétrons comportam-se de forma diferente quando se movem no interior ou nas bordas do material. [Imagem: Feng-feng Zhu et al. - 10.1038/nmat4384]


Supercondutor quente
Os físicos acreditam estar a um passo de comprovar a previsão teórica da existência de um material supercondutor a temperatura ambiente.
Há dois anos, uma equipe das universidades Tsinghua (China) e Stanford (EUA) previu a existência do estaneno, uma folha de estanho com um único átomo de espessura - assim como o grafeno é uma folha monoatômica de carbono.
Embora já se saiba que o grafeno foi apenas o começo nesse reino emergente de materiais monoatômicos, o que causou alvoroço é que os cálculos teóricos indicam que o estaneno será um supercondutor a temperatura ambiente.
Os supercondutores, materiais que conduzem eletricidade sem perdas, já têm muitos usos, mas precisam de temperaturas criogênicas para atingir o estado de resistência elétrica zero, o que inibe seu uso na maioria das aplicações.

Estaneno real
Agora, o grupo conseguiu pela primeira vez sintetizar o estaneno em laboratório. Eles criaram um vapor de estanho em um ambiente de vácuo e deixaram que os átomos se depositassem sobre um substrato, comprovando que o elemento realmente se cristaliza na forma prevista, formando o tão esperado estaneno.
O problema é que a deposição até agora só funcionou bem em uma placa de telureto de bismuto, um material que interfere com o estaneno, impedindo que a amostra fosse utilizada para comprovar a supercondutividade.
A equipe, assim como vários outros grupos ao redor do mundo, continuam em busca de uma forma mais simples e mais robusta de produzir o material, que eles acreditam funcionar como um isolante topológico, um tipo de material no qual os elétrons comportam-se de forma diferente quando se movem no interior ou nas bordas do material.
Em um isolante topológico, os portadores de carga, como os elétrons, viajam em uma direção que é dependente do seu spin. A corrente elétrica não é dissipada porque a maioria das impurezas não afeta o spin, não retardando os elétrons, advindo assim a supercondutividade.


Bibliografia

Epitaxial growth of two-dimensional stanene
Feng-feng Zhu, Wei-jiong Chen, Yong Xu, Chun-lei Gao, Dan-dan Guan, Can-hua Liu, Dong Qian, Shou-Cheng Zhang, Jin-feng Jia, Nature Materials, Vol.: Published online. DOI: 10.1038/nmat4384





sábado, 8 de agosto de 2015

Os mistérios da supercondutividade



Por Tárcio Fabrício e Ana Beatriz Tuma

Passados cem anos de sua descoberta, fenômeno continua a intrigar os cientistas, prometendo avanços tecnológicos revolucionários

 
Levitação: um dos incríveis fenômenos possibilitados pelos supercondutores.


Em 1911, o holandês Heike Kamerlingh Onnes (1853-1926) descobriu um fenômeno que mudaria o entendimento sobre a resistência elétrica dos materiais. A partir daquele momento, foi possível sonhar com a condução de grandes quantidades de energia sem nenhum tipo de perda. Tinha início a história da supercondutividade. Mas, afinal, por que o fenômeno da supercondutividade chama tanta atenção dos cientistas? Para onde a sua total compreensão e domínio podem nos levar?
       Antes de mergulharmos nas aplicações tecnológicas e nas pesquisas atuais relacionadas à supercondutividade, é necessário compreender como se dá tal fenômeno. Todo e qualquer material apresenta a chamada resistência elétrica. Nos condutores, quando uma corrente elétrica é adicionada, um grande número de elétrons livres começa a se deslocar de maneira desordenada, colidindo entre si e com obstáculos criados pelo próprio material condutor. Assim, boa parte dessa corrente é transformada em calor e dissipada, representando perda de energia, no chamado efeito Joule.
       Já nos supercondutores, a possibilidade de condução de energia sem perdas está relacionada à temperatura do material. Edson Vernek, do Instituto de Física da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), conta que mesmo antes da revolucionária descoberta de Onnes já eram conhecidas algumas dessas relações entre temperatura e condutividade elétrica. “Já se sabia que um pedaço de metal, quando está em temperatura alta, possui alta resistividade, isto é, apresenta dificuldade de passar corrente elétrica”, explica.
       Em seus experimentos, Onnes resfriou uma amostra de mercúrio utilizando hélio liquefeito e testou seu comportamento elétrico. Quando o material alcançou a temperatura de 4,2 K (-268,95 ºC), a resistência desapareceu. “Esta foi a grande surpresa, o começo da supercondutividade”, afirma Fabrício Macedo de Souza, também da UFU. “É o que chamamos de temperatura crítica”, explica Vitorvani Soares, do Instituto de Física da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “Quando o material é resfriado a temperaturas abaixo desse limiar é que se estabelece o fenômeno da supercondutividade”, completa.
       Entretanto, ainda faltava uma explicação para o fenômeno recém-descoberto por Onnes. Muitos cientistas buscaram essa explicação, como os irmãos alemães Fritz (1900-1954) e Heinz (1907-1970) London – com o chamado modelo de dois fluidos – e os russos Vitaly Ginzburg (1916-2009) e Lev Landau (1908-1968) – com a teoria denominada Ginzburg-Landau. Contudo, o entendimento mais preciso do fenômeno demorou 46 anos para acontecer, a partir dos estudos realizados por John Bardeen (1908-1991), Leon Cooper (1930) e John Robert Schrieffer (1931). A Teoria BCS, como ficou conhecida, explicou o fenômeno a partir da compreensão de como se formam os chamados “pares de Cooper”.


Pares de Cooper

Os pares de Cooper são pares de elétrons que começam a se formar quando os supercondutores são resfriados abaixo da sua temperatura crítica. “Assim, em pares, eles conseguem fluir mais livremente pelo material, sem que percam energia”, conta Evandro Vidor de Mello, do Instituto de Física da Universidade Federal Fluminense (UFF). Isto porque os pares de Cooper apresentam um comportamento diferente dos elétrons isolados, atuam como partículas de spin inteiro, o que permite que sejam condensados em um mesmo nível de energia.




Modelo das bolas de boliche (fonte: Branício, P. S., 2001.



Com isso, um dos elétrons, em sua passagem pela chamada rede cristalina, cria uma deformação, atraindo para perto de si o outro componente do par. Para compreender esse fenômeno, podemos pensar nesses elétrons como bolas de boliche em um colchão de água: Quando uma das bolas é empurrada para o centro do colchão, a deformação causada na superfície faz com que a segunda bola “role” para junto da primeira.
       Vernek, da UFU, esclarece que os elétrons pareados não estão necessariamente juntos, podendo estar distantes no sistema. “É como em um salão de danças, onde tem muita gente e os casais dançam. Um dos membros do casal pode estar de um lado e, o outro, em um ponto distinto do salão, e eles estão dançando juntos, pois sabem que são os pares.” (Veja aqui o vídeo “A dança da supercondutividade”.)


Caça aos supercondutores

De acordo com a Teoria BCS, que rendeu um prêmio Nobel para seus idealizadores, o fenômeno da supercondutividade seria improvável em materiais com temperaturas acima de 30 K (-243,2 ºC). Porém, em 1986, outra descoberta revolucionária tomou forma com Johannes Bednorz e Karl Müller, que descobriram um supercondutor cerâmico com temperatura crítica de 35 K (-238,2 ºC). A descoberta rendeu aos dois pesquisadores o Prêmio Nobel de Física em 1987, considerado o mais rápido da história.
       Os supercondutores cerâmicos abriram novas perspectivas de pesquisa e permitiram logo em seguida que Paul Chu e sua equipe descobrissem um óxido de ítrio-bário-cobre (YBa2Cu3O7) com temperatura crítica de 92 K (-181,2 ºC). Tal feito revolucionou as possibilidades de aplicação dos supercondutores, uma vez que é possível utilizar nitrogênio líquido – com temperatura de ebulição de 77 K – no resfriamento do material, em vez do hélio líquido, que é muito mais caro. Estava aberta a temporada de caça a novos materiais supercondutores em temperaturas mais elevadas.
       Se por um lado essas descobertas ampliaram a possibilidade de utilização desses materiais, por outro elas criaram novas perguntas para os cientistas, uma vez que a Teoria BCS explica o fenômeno em alguns materiais, mas não pode ser aplicada a outros. Justamente por isso, de acordo com Souza, da UFU, a supercondutividade ainda é uma área em aberto. “Não temos uma teoria que explique o comportamento dos supercondutores cerâmicos, de alta temperatura. Com certeza, o físico que conseguir explicar, também ganhará o Nobel”, conclui.



Peculiaridades

Vitorvani Soares, da UFRJ, revela que o fenômeno da supercondutividade ainda guarda outra característica muito particular: quando um campo magnético é aplicado a um material que encontra-se na fase supercondutora, gera um campo contrário e igual ao aplicado, fazendo com que o campo magnético de seu interior fique nulo. Essa descoberta coube a Walter Meissner (1882-1974) e Robert Ochsenfeld (1901-1993) que, em 1933, observaram que os supercondutores, quando colocados imersos em um campo magnético externo e resfriados abaixo de sua temperatura crítica, são capazes de expelir o campo magnético aplicado, no que ficou conhecido como “Efeito Meissner”. “É exatamente essa propriedade que possibilita a levitação desses materiais”, revela Mello, da UFF.




Transporte mais eficiente: Os MagLevs utilizam supercondutores para levitar, diminuir o atrito e, assim, alcançar altas velocidades.


A presença de um ímã próximo ao material supercondutor induz a formação de correntes na superfície desse material. Essas correntes geram seu próprio campo magnético, fazendo com que o campo do interior do material, quando somado ao campo externo, seja igual a zero. Assim, o campo do ímã é repelido pelo campo gerado na superfície do supercondutor, como se este último atuasse como um espelho refletindo o campo magnético do imã. De acordo com Mello, é esse o efeito que possibilita a criação dos trens do tipo MagLev.
       “Nos MagLevs, você precisa de campos magnéticos intensos. Na base do trilho, você usa bobinas supercondutoras para gerar campos magnéticos intensos. Onde o trem levita, não tem atrito e, sem o atrito, não há perda de energia e o trem pode adquirir altas velocidades”, afirma Souza.
       As características magnéticas dos materiais supercondutores também são distintas de acordo com o seu tipo. Enquanto nos supercondutores do tipo I o efeito Meissner é total, nos do tipo II existe a penetração parcial do campo magnético para dentro do material.
       Outra característica curiosa nessa relação entre supercondutividade e magnetismo é o fato de que quando os materiais supercondutores são expostos a campos magnéticos acima de determinado valor, o chamado campo magnético crítico, eles voltam a ser condutores normais. E, no caso dos supercondutores do tipo II, que apresentam temperaturas críticas mais elevadas, a transição para o estado supercondutor acontece de forma gradual e eles não apresentam o chamado efeito Meissner de forma ideal como os materiais do tipo I.



Tipos de Supercondutores







sexta-feira, 7 de agosto de 2015

A supercondutividade e os aceleradores de partículas



Por Flora Balieiro e Tárcio Fabrício


Muitas das descobertas sobre o misterioso mundo subatômico seriam inviáveis sem a existência dos supercondutores


Foi Demócrito o primeiro a dizer que os materiais eram constituídos de partículas minúsculas. A essas partículas o filósofo deu o nome de átomos. O termo vem do grego e significa “aquilo que não pode ser dividido em pedaços”, um termo bastante plausível para a ideia de átomo que existia na época. Os conhecimentos sobre o átomo mudaram desde então e, muito embora o termo cunhado por Demócrito não tenha caído em desuso, a fissão nuclear mostrou que era possível dividir o que antes era indivisível.
Partículas ainda menores que os prótons, nêutrons e elétrons foram descobertas e, a partir da década de 1950, com a construção dos primeiros aceleradores de partículas, iniciou-se uma corrida em busca das chamadas partículas elementares, sendo algumas delas de difícil detecção e de existência extremamente efêmera – em alguns casos, menos de um bilionésimo de segundo.
Genericamente falando, aceleradores de partículas são equipamentos que fornecem energia a partículas subatômicas eletricamente carregadas, fazendo com que elas atinjam altas velocidades. Nesses aceleradores, as partículas são dispostas em feixes, possibilitando que atinjam velocidades próximas à da luz! Esse tipo de acelerador normalmente é usado para se conhecer melhor as partículas subatômicas por meio de colisões entre elas.
Nemitala Added, do Departamento de Física Nuclear da Universidade de São Paulo (USP), explica que os trabalhos na área de Física Nuclear, tanto básica quanto aplicada, lidam com colisões nucleares para investigar a estrutura nuclear ou para o desenvolvimento de estudos interdisciplinares. “Analogamente a um jogo de bilhar, a colisão nuclear seria representada pelo choque entre as bolas e o taco teria a função de dar energia (acelerar) a uma das bolas em direção à outra”, ilustra o pesquisador.
Dentro dessa classe de aceleradores, podemos distinguir dois tipos básicos: os aceleradores lineares e os aceleradores circulares. Nos aceleradores lineares, as partículas percorrem rotas retilíneas no vácuo – em extensos tubos de cobre – antes de colidirem com o alvo, onde existem detectores específicos para registrar as partículas e a radiação que são liberadas durante a colisão.
Os aceleradores lineares utilizam eletroímãs para manter as partículas em um feixe estreito, já que, por terem carga elétrica de mesma natureza, elas tendem a se repelir.



Seção retilínea do LHC: Duas seções dessas são responsáveis por acelerar o feixe de partículas enquanto os 27 km curvos restantes servem somente para redirecionar o feixe (Foto Denis Damazio).



Mas onde é que entram os supercondutores nessa história? Bem, alguns tipos de acelerador exigem a utilização de campos magnéticos fortíssimos para funcionar, o que seria praticamente impossível de conseguir sem a utilização de bobinas supercondutoras.
Um exemplo desses aceleradores, do tipo Linac, está instalado no Instituto de Física da Universidade de São Paulo. O Linac é um tipo de acelerador linear que utiliza radiofrequência para transferir energia ao feixe de partículas a ser estudado. “No Linac são utilizados ressoadores supercondutores para otimizar a produção de campos elétricos com valores acima de 5 ou 6 MV/m usando uma potência de radiofrequência baixa, tipicamente da ordem de alguns Watts”, comenta Added. No laboratório da USP são desenvolvidos diversos tipos de pesquisa, que vão desde o campo da Física Nuclear até Física Ambiental e Biologia Nuclear.
“Na pesquisa básica usamos reações nucleares para entender o processo de produção dos elementos disponíveis no Universo. Alguns experimentos nos permitem simular a nucleossíntese de elementos, levando a um melhor entendimento da evolução e surgimento do Universo. No campo da Física aplicada, as áreas de interesse são diversas, indo desde a investigação de elementos-traços em materiais até estudos relacionados a ambientes com muita radiação, como o aeroespacial”, acrescenta o pesquisador.
A dinâmica de colisões relacionada ao surgimento e evolução do Universo também é estudada nos laboratórios do CERN (Conselho Europeu para Pesquisa Nuclear), que comporta a maior máquina aceleradora de partículas que já foi construída: o LHC. Essa estrutura supercondutora de 27 km de extensão é um tipo de acelerador circular. Nos aceleradores circulares, o princípio de funcionamento é semelhante ao dos lineares, mas com a diferença de que o trajeto é curvo. Nesses aceleradores, o grupo de partículas é lançado em um percurso cíclico, sendo acelerado a cada volta antes de colidir.
        O LHC – sigla para Large Hadron Colidor – está instalado no subsolo a quase 100 metros da superfície e possui dimensões equivalentes a cinco jatos jumbo. Esse laboratório foi desenvolvido para recriar as condições que existiram frações de segundo após a grande explosão (Big Bang) que originou o Universo. Durante o Big Bang, diversas partículas foram criadas e, embora algumas delas ainda persistam – tais como prótons, neutrons e elétrons –, muitas outras, mais energéticas, já não existem em seu estado natural. Por meio da colisão interpartículas é possível produzir traços que podem nos levar à origem do Universo.
        Outros tipos de aceleradores não necessitam de supercondutores, como é o caso do acelerador de luz síncrotron localizado no Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), em Campinas. Nesse tipo de acelerador as partículas utilizadas são os elétrons, que emitem radiação ao serem acelerados. O LNLS, diferentemente do LHC e do Linac, estuda essa radiação liberada, chamada luz síncrotron. Analisando o espectro emitido pelos elétrons, os cientistas podem inferir características atômicas e moleculares dos materiais estudados.
        No LHC, onde são necessárias colisões de alta energia, em vez de elétrons são acelerados prótons – partículas duas mil vezes mais pesadas e que emitem menos luz ao serem aceleradas. Essas colisões são capazes de gerar partículas mais pesadas, as quais remetem àquelas criadas durante o surgimento do Universo.

Supercondutores

        Fabiano Colauto, do Departamento de Física da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), explica que, sob altas velocidades em uma trajetória curva, as partículas sofrem a ação da força centrípeta. Para manter os prótons no anel de 27 km do LHC, são usados campos magnéticos muito intensos (duzentas mil vezes o campo da Terra) ao longo do caminho. Os campos magnéticos também fazem o papel de manter o feixe de partículas coeso, pois como elas têm a mesma carga elétrica, sem a atuação do campo elas se repeliriam.


 
Seção de um condutor em cobre - maior diâmetro - ao lado de um cabo supercondutor: ambos são capazes de suportar uma corrente de 13 mil Amperes necessárias à operação do LHC (Foto Denis Damazio).


Denis Damazio, pesquisador brasileiro que trabalha no ATLAS, um dos quatro detectores encontrados no CERN, explica que para criar um campo forte o bastante é necessário aplicar uma corrente elétrica muito intensa e, para isso, a utilização dos supercondutores é imprescindível. “No LHC a corrente aplicada é da ordem de 13 mil amperes. Um material comum não resistiria ao calor gerado pela passagem dessa corrente. Os prótons recebem campo elétrico em uma sessão retilínea curta, onde são acelerados, para em seguida o campo magnético gerado pelo supercondutor redirecionar as partícula. O que acontece é que o grupo de partículas passa por essa sessão reta 11 mil vezes por segundo, sendo aceleradas a cada volta. A grande vantagem dos materiais supercondutores é que eles não oferecem resistência à corrente elétrica e, por isso, não estão sujeitos ao superaquecimento.”
Os campos magnéticos gerados pelo supercondutor no CERN não são utilizados somente para permitir a colisão entre as partículas. No ATLAS, eles também permitem a identificação de cargas. “Como produtos da colisão de prótons são geradas diversas partículas. Uma delas, a partícula Z, logo após ser criada, emite um elétron e um pósitron. Para distinguir essas duas partículas emitidas são usados campos magnéticos gerados por supercondutores. Assim, ao passarem pelo campo, as partículas positivas (pósitrons) irão entortar sua trajetória para uma direção, enquanto as negativas (elétrons) irão na direção oposta”, comenta o pesquisador do ATLAS. “Observando a inclinação dessa trajetória, também é possível inferir a velocidade da partícula. Uma partícula muito rápida irá descrever uma trajetória praticamente reta, enquanto uma partícula mais lenta irá entortar sua trajetória”, acrescenta Damazio.


 
  
Painel mostrando a temperatura de um dos magnetos supercondutores na bancada de testes (1.9 K ou -271 ºC) no CERN (Foto DenisDamazio).


Segundo o pesquisador, o que encarece o uso de supercondutores é principalmente o custo do próprio material, embora mantê-lo nas temperaturas necessárias à supercondutividade também seja bastante caro. Os materiais utilizados nas bobinas normalmente tornam-se supercondutores à temperatura do hélio líquido. “Um litro de hélio, hoje, custa aproximadamente US$ 20. Existem formas de se recuperar o hélio utilizado para resfriar o sistema, mas nesse processo sempre existem perdas e, por isso, o material tem de ser reposto constantemente”, explica Fabiano Colauto, da UFSCar. Ainda assim, o uso de supercondutores no LHC foi a solução mais prática encontrada, tanto do ponto de vista técnico quanto do econômico.
Colauto esclarece que a escolha de bobinas supercondutoras em detrimento de bobinas construídas com condutores comuns depende de vários fatores. “Bobinas supercondutoras dependem de um sistema de resfriamento contínuo, mas são mais leves e compactas que as comuns”, exemplifica. “Cada material supercondutor tem suas próprias características; por isso, a escolha do material a ser utilizado também é consequência de um balanço, que deve levar em conta a temperatura de resfriamento, a corrente máxima (crítica) que ele suporta e o campo magnético máximo. No Linac, o material supercondutor escolhido para a região interna dos ressoadores foi o Nióbio, o mesmo utilizado no ATLAS. O fato do Brasil ser o maior produtor de Nióbio do mundo favoreceu a escolha”, conta o professor Added, da USP.
        Os cabos supercondutores do LHC são feitos de uma liga de Nióbio e Titânio (NbTi), um material que é estruturalmente favorável às necessidades mecânicas do acelerador e que mantém suas propriedades supercondutoras mesmo com a passagem de altas correntes elétricas. “As ligas metálicas são preferíveis aos materiais cerâmicos para a construção de bobinas supercondutoras, pois são mais maleáveis, enquanto supercondutores cerâmicos podem sofrer trincas com a constante variação de temperatura a que são submetidas as bobinas. Além disso, os supercondutores metálicos possuem propriedades diamagnéticas mais simples de serem estudadas e mais previsíveis que as encontradas nos materiais cerâmicos”, explica Colauto. “Mas a intenção no futuro é que os materiais cerâmicos substituam os materiais metálicos na construção de dispositivos supercondutores, já que a temperatura crítica para manifestar supercondutividade nos cerâmicos é mais alta. Assim, o nitrogênio líquido (77 K) poderá ser utilizado no lugar do hélio líquido (4,2 K), que é muito mais caro e de difícil obtenção”, conclui.


Por dentro do CERN



Diagrama do complexo de aceleradores do CERN: A linha destacada em laranja, marcada para Gran Sasso, foi responsável pela "descoberta" de neutrinos viajando acima da velocidade da luz (Foto Denis Damazio).







quarta-feira, 5 de agosto de 2015

Um receptor supercondutor para comunicação óptica a partir da Lua (A superconducting photon-counting receiver for optical communication from the Moon)



As explorações e missões da Nasa exigem taxas de dados maiores do que aquelas atualmente disponíveis. A Deep Space Network (Rede do Espaço Profundo) - um sistema de comunicação internacional para apoiar missões de naves espaciais - utiliza a tecnologia mais atual de rádio frequência (RF) para redes de espaço livre (aquelas que transmitem dados através do espaço em vez de usar estruturas sólidas como cabos de fibra óptica). Uma rede de comunicações de espaço livre com base na tecnologia óptica oferece taxas de dados que são ordens de grandeza maior do que a RF. Além disso, é menor e mais leve, uma característica particularmente importante para os terminais de satélite carentes de recursos de energia.
Para explorar estas vantagens, a Nasa vem trabalhando em demonstrações laboratoriais para um sistema real, o Lunar Laser Communication Demonstration (LLCD). O projeto inclui um terminal óptico no espaço, o Lunar Lasercom Space Terminal (LLST)1 (Figura 1), lançado como uma carga no Lunar Atmosphere and Dust Environment Explorer (Ladee), e um terminal ​​de chão transportável, o Lunar Lasercom Ground Terminal (LLGT)2.
O LLST lançado em 07 de setembro de 2013 atingiu 250 km em órbita acima da superfície lunar no início de outubro. Durante o mês seguinte, foram estabelecidas comunicações livres de erros entre o LLST e o LLGT. Este link de comunicação a laser de 230.000 km foi o mais longo já construído, e demonstrou as taxas de comunicação de dados mais altas atingidas de ou para a Lua. Além disso, o sistema utiliza símbolos de dados estruturados e hardware adicional para conseguir medições contínuas do tempo de voo de ida e volta com resolução bem menor do que 200 ps3.


  
Figura 1. (a) Módulo óptico do Lunar Lasercom Space Terminal. (b) Módulo óptico montado na nave espacial Lunar Atmosphere and Dust Environment Explorer.


A luz do LLST foi recolhida em quatro telescópios de 40 centímetros no terminal LLGT localizado no Novo México. Cada telescópio foi acoplado a uma fibra personalizada que mantém a polarização que foi então concentrada em um conjunto de quatro nanofios supercondutores de nitreto de nióbio (NbN) detectores de um único fóton (superconducting nanowire single-photon detectors - SNSPDs). Tais detectores são baseados em supercondutores que operam abaixo das suas temperaturas críticas com uma corrente constante logo abaixo da corrente crítica. Quando um único fóton é absorvido no nanofio, a corrente supercondutora é interrompida e resulta numa resistência finita que pode ser medida como um pulso de tensão na saída antes do nanofio relaxar rapidamente ao seu estado supercondutor. Os SNSPDs estão disponíveis desde 2001,4 mas para o programa LLCD, alguns avanços foram necessários para atingir a alta eficiência do sistema de detecção de fótons (PDE) e baixos tempos de reposição para suportar a taxa de dados de 622 Mb/s.5
A concepção e construção de cavidades ópticas também foi modificada para melhorar a absorção de fótons e o PDE,6 bem como a concepção de matrizes intercaladas para aumentar as taxas de contagem.7 Os dispositivos de nanofios foram fabricados usando a litografia por feixe de elétrons em filmes de NbN cultivados em substratos de silício/dióxido de silício. Os nanofios formaram um padrão circular de 14 μm de diâmetro, com quatro nanofios intercalados, que foram colocados em uma cavidade óptica (veja Figura 2) para alcançar um PDE de 75%. As matrizes SNSPD foram mantidas a uma temperatura de 2.7 K em uma de duas fases do ciclo (ver Figura 3). Os estágios eletrônicos10 foram alojados em prateleiras ao lado do sistema criogênico, e todos foram alojados remotamente a partir de telescópios ligados por fibra personalizada.


Figura 2. (a) Micrografia eletrônica de varredura do padrão intercalado dos nanofios supercondutores detectores de um único fóton (SNSPD). (b) Perfil esquemático da matriz SNSPD e da cavidade óptica. Si: silício. SiO2: dióxido de silício.



  
Figura 3. Topo: O Lunar Lasercom Ground Terminal (LLGT) em White Sands, no Novo México. Canto inferior direito: O refrigerador criogênico montado para as quatro matrizes SNSPD. Canto inferior esquerdo: sistema criogênico de processamento de sinais eletrônicos.


Em resumo, o LLCD alcançou uma taxa de transmissão de dados livre de erros de 622 Mb/s entre o terminal LLST em um satélite em órbita lunar e o terminal LLGT na Terra usando um receptor de um único fóton de nanofios supercondutores de NbN. Esta demonstração constituiu o elo de comunicação a laser de maior alcance já construído e as taxas de dados de comunicação mais altas atingidas de ou para a Lua. Com base no sucesso do LLCD, a Nasa está preparando a implantação de terminais ópticos de comunicações a laser para operações espaciais.



Matthew Grein, Eric Dauler, Andrew Kerman, Matthew Willis, Barry Romkey, Bryan Robinson, Daniel Murphy, Don Boroson
Instituto de Tecnologia de Massachusetts
Laboratório Lincoln
Lexington, MA


Referências

1. B. S. Robinson, D. M. Boroson, D. A. Burianek, D. V. Murphy, Overview of the Lunar Laser Communications Demonstration, Proc. SPIE 7923, p. 792302, 2011. doi:10.1117/12.878313
2. D. Fitzgerald, Design of a transportable ground telescope array for the LLCD, presented at SPIE Photonics West, San Francisco, CA, 2011.
3. D. M. Boroson, B. S. Robinson, D. V. Murphy, D. A. Burianek, F. Khatri, J. M. Kovalik, Z. Sodnik, D. M. Cornwell, Overview and results of the lunar laser communication demonstration, Proc. SPIE 8971, p. 89710S, 2014. doi:10.1117/12.2045508
4. G. N. Gol'tsman, O. Okunev, G. Chulkova, A. Lipatov, A. Semenov, K. Smirnov, B. Voronov, A. Dzardanov, C. Williams, R. Sobolewski, Picosecond superconducting single-photon optical detector, Appl. Phys. Lett. 79, p. 705-707, 2001.
5. A. J. Kerman, E. A. Dauler, J. K. W. Yang, K. M. Rosfjord, V. Anant, K. K. Berggren, Constriction-limited detection efficiency of superconducting nanowire single-photon detectors, Appl. Phys. Lett. 90, p. 101110, 2007.
6. K. M. Rosfjord, J. K. W. Yang, E. A. Dauler, A. J. Kerman, V. Anant, B. M. Voronov, G. N. Gol'tsman, K. K. Berggren, Nanowire single-photon detector with an integrated optical cavity and anti-reflection coating, Opt. Express 14, p. 527-534, 2006.
7. E. A. Dauler, B. S. Robinson, A. J. Kerman, J. K. W. Yang, K. M. Rosfjord, V. Anant, B. Voronov, G. Gol'tsman, K. K. Berggren, Multi-element superconducting nanowire single-photon detector, IEEE Trans. Appl. Supercond. 17, p. 279-284, 2007.
8. A. J. Kerman, J. K. W. Yang, R. J. Molnar, E. A. Dauler, K. K. Berggren, Electrothermal feedback in superconducting nanowire single-photon detectors, Phys. Rev. B 79, p. 100509, 2009.
9. A. J. Kerman, D. Rosenberg, R. J. Molnar, E. A. Dauler, Readout of superconducting nanowire single-photon detectors at high count rates, J. Appl. Phys. 113, p. 144511, 2013.
10. M. E. Grein, A. J. Kerman, E. A. Dauler, O. Shatrovoy, R. J. Molnar, D. Rosenberg, J. Yoon, et al., Design of a ground-based optical receiver for the Lunar Laser Communications Demonstration, Proc. Int'l Conf. Space Opt. Syst. Appl., p. 78-82, 2011.



Entre em contato

Nome

E-mail *

Mensagem *

Supercondutividade ao seu alcance (clique na imagem)

Supercondutividade ao seu alcance (clique na imagem)
Nosso canal no YouTube!

Elementos supercondutores (clique na imagem)

Elementos supercondutores (clique na imagem)
Supercondutores à pressão ambiente e sobre altas pressões

Evolução da temperatura crítica (clique na imagem)

Heike Kamerlingh Onnes’s Discovery of Superconductivity

Heike Kamerlingh Onnes’s  Discovery of Superconductivity
Clique na imagem para acessar o artigo da Scientific American!

Room-Temperature Superconductivity

Room-Temperature  Superconductivity
Livro gratuito, clique na imagem para acessar!

O trem flutuante brasileiro!