Com
informações da Agência Fapesp -
28/11/2017
Os filamentos de coloração
branca correspondem à fase minoritária, com cerca de 98% de nióbio e 2% de
boro, responsável pela supercondutividade. Já as regiões acinzentadas, em maior
fração volumétrica, correspondem ao monoboreto de nióbio propriamente
dito.[Imagem: F. Abud et al. - 10.1103/PhysRevMaterials.1.044803]
Por mais de 65 anos, um composto de
nióbio e boro, chamado monoboreto de nióbio (NbB), foi considerado um exemplo
clássico de um material supercondutor, um material no qual a corrente elétrica
flui livremente, com resistência virtualmente zero.
Mas esse "conhecimento",
registrado nos manuais de física da matéria condensada e em inúmeros artigos
científicos especializados, foi agora contestado por pesquisadores das
universidades de São Paulo (USP) e Estadual de San Diego (EUA).
Os físicos descobriram que a
supercondutividade detectada no material não é produzida pelo próprio
monoboreto de nióbio (NbB), mas por filamentos de nióbio quase puro que
margeiam os grãos microscópios do material.
“Sabemos que o elemento nióbio (Nb), sozinho, apresenta
supercondutividade quando resfriado a temperaturas muito baixas, da ordem de
9,2 Kelvin (K). Agora, descobrimos que isso não ocorre com o monoboreto de
nióbio (NbB) propriamente dito. Ocorre que, nas amostras de NbB, existe uma
grande fração volumétrica de NbB, mas também uma pequena quantidade de Nb quase
puro. São duas fases cristalinas distintas que coexistem nos materiais
estudados. É essa fase minoritária, composta por aproximadamente 98% de nióbio
e 2% de boro, que se comporta como supercondutora,” explica o professor
Renato de Figueiredo
Jardim.
Os pesquisadores observaram que, mesmo
ocorrendo em uma pequena fração volumétrica, a fase minoritária (Nb0,98B0,02)
é supercondutora e forma uma rede tridimensional através da qual a corrente
elétrica pode transitar de uma extremidade a outra do material.
É muito provável que essa característica
tenha confundido os descobridores originais da supercondutividade no NbB,
levando-os a atribuir a supercondutividade abaixo de aproximadamente 9 Kelvin a
esse composto.
“Identificamos claramente essa estrutura reticular por meio
da microscopia eletrônica de varredura. Essa evidência visual foi, por assim
dizer, uma prova qualitativa da propriedade. Mas não podíamos sustentar a nossa
hipótese apenas neste ponto. Era preciso ir adiante, buscando também uma prova
quantitativa, e foi isso que fizemos, aplicando um modelo termodinâmico aos
dados tomados nos materiais estudados. Por meio dele, obtivemos então a
comprovação procurada,” explicou Jardim.
Segundo o pesquisador, não há,
atualmente, expectativa de aplicação tecnológica para o monoboreto de nióbio. “Mas existe um
'primo' dele, o diboreto de magnésio (MgB2), que passou a despertar
grande interesse desde o início da década passada. Pode ser que nossa pesquisa
venha contribuir para sua aplicação tecnológica”, disse.
Do ponto de vista macroscópico, a
supercondutividade é uma propriedade exibida por certos materiais que, abaixo
de uma dada temperatura, passam a conduzir corrente elétrica sem nenhuma perda
de energia, isto é, sem resistência elétrica.
“Concomitantemente a essa propriedade macroscópica existe
outra propriedade, também macroscópica, que é o chamado 'diamagnetismo
perfeito',” disse Jardim. Essa segunda propriedade faz com que um
supercondutor, na presença de um campo magnético, expulse todo o fluxo
magnético do seu interior.
O diamagnetismo está presente em todos
os materiais. Porém, é muitas vezes tão fraco que sua manifestação fica
encoberta pela presença de outras respostas magnéticas mais robustas, como o
ferromagnetismo - que faz o material ser atraído pelo campo magnético externo -
e o paramagnetismo - que faz os dipolos magnéticos atômicos se alinharem
paralelamente ao campo magnético externo.
Quando a resposta diamagnética é
suficientemente forte, como ocorre nos supercondutores, a repulsão provocada
pelo campo magnético pode fazer o material levitar, um fenômeno explorado por
alguns trens de alta velocidade.
Bibliografia:
Absence of superconductivity in NbB. F. Abud, L. E.
Correa, I. R. Souza Filho, A. J. S. Machado, M. S. Torikachvili, R. F. Jardim. Physical
Review Materials. Vol.: 1, 044803. DOI: 10.1103/PhysRevMaterials.1.044803.